Teixeira de Freitas 1970 - A floresta caiu, ficou o deserto, nasceu a violência
Por Daniel Rocha
Lá em 1977, o jornal O Estado de S. Paulo publicou uma reportagem que ainda hoje dá o que pensar. O título já dizia tudo: “A floresta cai, fica o deserto, nasce a violência.”
Os repórteres Carlos Monforte, Luiz Valério Meinel e Paulo César de Araújo rodaram os povoados que cresciam às margens da BR-101, Eunápolis, Itabela, Teixeira de Freitas e tantos outros, e mostraram como o “progresso” da época vinha custando caro: a destruição da Mata Atlântica, uma das florestas mais ricas do mundo.
A região aparecia nos jornais como uma terra promissora, mas os repórteres chamaram atenção para o lado que ninguém queria ver: o preço ambiental e social desse “crescimento rápido”.
A matéria terminava com uma pergunta que ainda faz sentido hoje: “Depois da rica floresta, os eucaliptos seriam a solução?”
A resposta veio com o tempo — e não foi boa. Desde 1947, o norte do Espírito Santo já tinha perdido quase toda a sua floresta nativa. Só uma empresa exportou mais de 60 mil jacarandás em vinte anos!
Quando as árvores acabaram por lá, as empresas madeireiras subiram para o sul da Bahia. Abriram estradas, fundaram vilas, e deixaram um rastro de destruição.
Na década de 1970, o ritmo era assustador: cerca de 14 milhões de árvores eram cortadas por ano entre os rios Doce e Jequitinhonha. Quando a madeira nobre se esgotou, chegaram as reflorestadoras, com a promessa de “recuperar” o que foi perdido.
Mas o que veio no lugar da mata foi um imenso tapete verde de eucalipto, deserto verde, bonito de longe, mas pobre de perto. Uma floresta de uma única espécie, que seca o solo, espanta os bichos e não dá sustento para quem mora por perto.
O resultado foi o que já se esperava: rios secando, clima mudando, gente indo embora do campo para os povoados, como Teixeira de Freitas que se tornaram cidades, deixando uma terra que antes vivia virando terras sem cultivos de alimentos.
Dessa forma, o “progresso” prometido nas décadas de 1970 e 1980, revelou-se um modelo predatório de crescimento econômico e social, voltado ao lucro rápido e sustentado pela exploração desenfreada dos recursos naturais.
O resultado foi o aumento da desigualdade, o avanço da violência e a degradação ambiental, ainda que mascarados por algumas transformações urbanas sem base sustentável.
Hoje, quase cinquenta anos depois daquela reportagem, é importante olhar para trás e entender o que aconteceu. A história da Mata Atlântica no Extremo Sul da Bahia mostra que desenvolvimento sem cuidado com a natureza é só um avanço de fachada.
A floresta virou deserto porque se acreditava que derrubar era o mesmo que crescer. Saber disso é mais do que lembrar o passado, é um jeito de não repetir o mesmo erro no futuro.
Referências
CAPOBIANCO, J. P. R. (Ed.). Dossiê Mata Atlântica 2001: Projeto Monitoramento Socioambiental. Sociedade Nordestina de Ecologia, 2001.
MESQUITA, C. A. B. “Serrarias fazem festa no sul da Bahia.” Revista Parabólicas, n. 33, 1997.
MESQUITA, C. A. B. No prelo; Rede de ONGs da Mata Atlântica, 2001.
SANT’ANNA, A. G. O papel do cluster madeireiro no desenvolvimento do Extremo Sul da Bahia. 2007. 80 f. Dissertação (Mestrado em Economia Empresarial) – Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro, 2007.
O ESTADO DE S. PAULO. “A posse ilegal de terras provoca mortes” / “A floresta cai, fica o deserto, nasce a violência.” Reportagem de Carlos Monforte, com informações de Luiz Valério Meinel e Paulo César de Araújo. O Estado de S. Paulo, 15 de maio de 1977, pp. 168–169.
COOPMANS, Padre José. Além do Eucalipto: O papel do Extremo Sul. 2005.
RETROSPECTIVA Histórica de Teixeira de Freitas. Direção Geral: Alberto Silva e Zé da Baiana. Produção: Magnólia Ellias Galvão e Ady Regina Muniz. Suporte: DVD (45 min). Ano: 1996.
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