Teixeira de Freitas 1997 – Contradições na Festa da Cidade
Por Daniel Rocha
Em 1997, Teixeira de Freitas realizou um dos maiores carnavais fora de época de sua história, com uma estrutura grandiosa, superando as festas anteriores em termos de organização, atrações e público. A Micareta daquele ano reuniu, segundo estimativas, cerca de 60 mil pessoas durante os quatro dias de festa, consolidando-se como um marco na trajetória cultural da cidade.
Diferente das edições do início dos anos 1990, quando a Praça da Independência, hoje Praça da Bíblia, era o palco principal para gincanas organizadas por equipes ligadas a igrejas e instituições escolares, a Micareta de 1997 seguiu uma tendência iniciada em 1994: os blocos na avenida. Essa mudança refletia uma nova dinâmica na festa, que passou a ser dominada por blocos no estilo carnavalescos, cada um com sua própria indentidade e público.
Em tese, essa divisão, embora comum em festas populares da capital Salvador, intensificava as tensões e, consequentemente, a violência. Blocos como Viwa, Quero Mais, Flamante, Furacão 2000, Macaco Prego e Tomate com Laranja dominavam a avenida, cada um com seu próprio padrão de acesso, abadás e público específico.
O bloco Macaco Prego, por exemplo, já se consolidava como um dos maiores da região, atraindo grandes nomes da música, como o Terra Samba, que vivia o auge de sua carreira. Com isso, a festa se alinhava ao estilo predominante das micaretas soteropolitanas.
Com base nas informações disponíveis, estima-se que a desigualdade de acesso aos blocos era evidente. Essa dinâmica social pode ter contribuído para uma maior tendência a conflitos, resultando em riscos de agressões que tornaram necessária a implementação de um esquema de segurança robusto, como o que foi montado e observado.
Por isso, de acordo com o jornal A Tarde, a segurança foi um dos pontos altos da organização da Micareta de 1997. Sob o comando do major Bartolomeu Calheiros, do 13º Batalhão da Polícia Militar, foi montado um esquema nunca antes visto na cidade.
De acordo com o jornal, o major mobilizou um efetivo de 600 homens, incluindo praças, cabos, sargentos e oficiais, que atuaram tanto no circuito da festa quanto nos arredores. Enquanto os policiais no interior do evento trabalharam apenas com cassetetes, os oficiais ficaram responsáveis pelo uso de armas de fogo, caso necessário.
Além disso, foram realizadas blitze 24 horas por dia nos principais pontos de acesso ao centro da cidade, e agentes à paisana foram infiltrados entre os foliões para coibir furtos, assaltos e o tráfico de drogas. Na Estação Rodoviária, os PMs utilizaram detectores de metal para impedir que foliões chegassem armados à cidade.
Essas medidas de segurança refletiam um possível cenário de tensões sociais e uma crescente violência urbana que já preocupava na época. A divisão entre aqueles que podiam pagar pelos blocos e os que ficavam na “pipoca” era uma realidade aceita por muitos foliões, mas evidenciava as desigualdades inerentes à estrutura do evento.
Dessa forma, a Micareta não era apenas uma “festa da cidade”, mas também um reflexo das contradições e desafios da sociedade teixeirense. Além disso, em certos aspectos, representava a disputa pelo poder administrativo local.
No campo político, a Micareta de 1997 foi um reflexo dessas disputas. Wagner Mendonça, eleito prefeito em 1996, ainda estava sob a forte influência de Temóteo Brito, seu antecessor e padrinho político. Tanto que, em um texto do jornal A Tarde, Wagner sequer foi citado como organizador do evento, e o crédito pela festa ficou todo com Temóteo, legítimo representante do carlismo na cidade.
O rompimento político entre os dois, em 1998, transformou o cenário político local. Wagner Mendonça ficou isolado, sem apoio dos governos estadual e federal, o que impactou diretamente sua capacidade de realizar eventos de grande porte. Essa limitação se manteve até os anos seguintes, quando ele começou a articular sua reeleição e retomou a realização das festividades com força total.
A Micareta de 1998, por exemplo, foi marcada por incertezas e só foi confirmada 16 dias antes do aniversário da cidade. No fim das contas, a Micareta de 1997 foi muito mais do que um simples carnaval fora de época. Foi um evento que refletiu as transformações, contradições e desafios de Teixeira de Freitas naquele período, carregado de significados políticos e sociais, deixando um legado inesquecível na história da cidade.
Daniel Rocha da Silva
Historiador graduado e pós-graduado em História, Cultura e Sociedade pela UNEB-X.
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