Teixeira de Freitas 1950 – Uma história da Av. São Paulo

 

Por Daniel Rocha

No centro de Teixeira de Freitas, a Avenida São Paulo não é apenas uma via de circulação, é um marco vivo da história local. Aberta na década de 1950, sua função inicial não se limitava a ligar dois pontos no mapa: representava a abertura de caminho para o crescimento econômico e a transformação urbana que se seguiria.

A construção da avenida insere-se em um momento de intensas mudanças no extremo sul da Bahia. A região recebia fluxos migratórios significativos, o comércio se expandia e a paisagem natural cedia espaço a novas formas de ocupação e trabalho. A avenida tornou-se, assim, símbolo e testemunha dessa transição — ponto de partida do processo de expansão urbana que moldaria Teixeira de Freitas.

Sua origem remonta a 1948, quando a instalação de uma empresa de extração de madeira em Nova Viçosa impulsionou a abertura de uma rota terrestre ligando o distrito de Juerana, em Caravelas, à divisa entre os municípios de Alcobaça e Caravelas, em busca de reservas de madeiras nobres. Essa estrada, denominada “Eleosippo Cunha”, viria a constituir o embrião da atual Avenida São Paulo.

Antes de servir como corredor para os caminhões madeireiros, o traçado atravessava terrenos marcados por lagos e córregos, impondo obstáculos naturais ao avanço do desmatamento que, de forma cada vez mais intensa, transformava uma paisagem preservada em área de exploração econômica.

O traçado original foi concebido para atender diretamente aos interesses das companhias madeireiras, permitindo o transporte da madeira extraída e enfrentando os desafios impostos pela geografia local. Um dos pontos mais críticos foi a lagoa situada onde hoje se encontra o PátioMix.
Conforme relatou Emanuel Siquara, fiscal de obras do município de Caravelas à época, a solução encontrada foi contornar a área pantanosa — desvio que permanece visível na atual rotatória ao final da avenida.

A superação desse obstáculo foi possível graças ao uso de máquinas pesadas, como um patrol e dois tratores cedidos pela empresa responsável pela linha férrea Bahia-Minas, ainda ativa na região.

Segundo recordou Servídio Nascimento Correia em entrevista à Revista Regional Sul (1992), o trabalho avançou rapidamente: em quinze dias, os operários alcançaram o ponto onde mais tarde se ergueria o centro da cidade.

Mais do que abrir uma estrada, a ação do capital madeireiro redefiniu a ocupação do território. A mata densa deu lugar a um espaço moldado para novas atividades econômicas e sociais.

A abertura da via provocou um aumento expressivo no fluxo de pessoas e mercadorias, atraindo migrantes e comerciantes — muitos deles afrodescendentes já residentes na região — que se estabeleceram ao longo do traçado até a atual Praça dos Leões, marco zero da cidade.

AV.São Paulo. Foto: Década de 1980.

Esses pioneiros formaram pequenos núcleos comerciais, especialmente nos trechos hoje correspondentes às Avenidas Lomanto Júnior e Marechal Castelo Branco. Essas áreas receberam denominações populares como “Comércio dos Pretos” e “Tira-banha”, antes de a localidade ser oficialmente chamada Teixeira de Freitas.

Em depoimento à revista Origens (1985), Isael de Freitas Correia rememorou figuras como Manoel de Etelvina e Chico D’Água, primeiros moradores da estrada, que ergueram casas de palha, reflexo das condições precárias iniciais.

Com o tempo, essas moradias improvisadas deram lugar a construções mais permanentes, acompanhando a integração da Avenida São Paulo à malha rodoviária regional, em especial à BA-290, que ligava Alcobaça a Medeiros Neto.

Essa ligação funcionou como um sistema de vasos comunicantes, acelerando a transformação do povoado em um núcleo próspero e, na década de 1980, candidato à emancipação política.

A história da Avenida São Paulo reflete a interseção entre exploração de recursos naturais, expansão de infraestrutura e urbanização no Brasil do século XX.

Originada de um projeto voltado à exploração madeireira, tornou-se eixo estruturador da ocupação de Teixeira de Freitas e espaço de encontro entre capital empresarial e economia popular.

Sua trajetória expressa as contradições de um progresso que, ao mesmo tempo em que impulsionou o crescimento urbano, provocou alterações profundas e irreversíveis no ambiente e nos modos de vida locais.

Fontes:

Revista Regional Sul. Teixeira de Freitas – Bahia. Março de 1992.

BANCO DO NORDESTE, As origens. Teixeira de Freitas, Fortaleza – Ceará. P.05-07, Janeiro 1986

FERREIRA, Susana. A vida privada de negros pioneiros no povoamento de Teixeira de Freitas na década de 1960. Uneb Campus-X.

Diagnóstico Socioeconômico da Região Cacaueira de 1976. Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira – CEPLAC, 1976.

Conversa informal com o senhor Emanuel Siquara. Setembro de 2017.

Foto: AV. São Paulo, década de 1980. . Disponibilizada pelo Acevo Cultura de Teixeira de Freitas, em 2016.

Daniel Rocha – Historiador graduado e pós-graduado em História, Cultura e Sociedade pela UNEB-X.

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WhatsApp: (73) 99811-8769

E-mail: samuithi@hotmail.com


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