CARAVELAS 1885: EPIDEMIA MATOU MILHARES NA CIDADE
Citações e Referência.
Daniel Rocha da Silva*
De acordo com uma propaganda publicada em um jornal em 1909, no período estava em alta o uso do “Elixir Tibornina, um específico eficaz da Flora Brasileira” que prometia trazer a “cura radical das moléstias e das impurezas do sangue por mais crônicas e rebeldes que sejam.” O jornal era conhecido por publicar relatos dos usuários e de médicos a fim de divulgar e acrescentar credibilidade ao produto natural.
Neste periódico é possível ter acesso ao relato do Dr. José Carlos Gomes da Silva que, segundo o texto, atuava na portuária cidade de Caravelas, extremo sul da Bahia. Datado de 1º de dezembro de 1888, o relato apresentado no jornal traz uma fala do médico sobre o uso do medicamento em pacientes locais exaltando as qualidades do produto.
“Atesto que tenho empregado na minha clínica o “Elixir de Tibornina” do farmacêutico Floriano Serpa obtendo sempre ótimos resultado na sífilis em suas diversas manifestações, razão que me obriga a preferir-o a outro qualquer medicamento aconselhado nas preferidas moléstias”.
Não à toa a cidade é citada no relato do uso do medicamento no combate à sífilis, pois na época a portuária era dona de um dos portos mais movimentados da região, a Companhia Baiana e a Companhia Espírito Santos e Caravelas de Navegação de passageiros realizava paradas regulares no lugar que, também, era ponto final da estrada de ferro Bahia-Minas que ligava a micro região a fronteira próxima com minas.
Esses fatos aferem uma credibilidade ao relato da propaganda porque diante de um intenso movimento de pessoas, logo um ambiente propício à circulação e contágio da doença que no período era muito comum entre os brasileiros.
No livro Casa grande e Senzala, por exemplo, Freyre traz citações e afirma a partir destas que desde o século XVIII o Brasil era assinalado em livros estrangeiros como “a terra da sífilis por excelência” e que na zona mais colonizada, litoral, sempre foi larga a extensão da doença associada ao grande vigor sexual dos colonizadores e dos negros escravizados. Tanto que a publicidade de remédios, elixires e garrafadas para tratamento de males venéreos “faz-se de forma escandalosa.”
Fatos que permite supor, como já delineado, que o trânsito intenso de trabalhadores e passageiros elevaram os casos da doença transmitida por via sexual, uma das mais combatidas pela saúde pública nas últimas décadas do século XIX e nas primeiras do século XX, nas cidades portuárias como Caravelas, onde o tal Dr. José Carlos, como informa o texto, fez uso do produto anunciado em um jornal soteropolitano de 1908.
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No início de 1980 o regime militar cambaleava, os partidos e a sociedade civil organizada alinhavam-se nas capitais e no interior para exigir a volta da democracia e o fim da supressão dos direitos constitucionais.
Em 1982 novos desdobramentos dos protestos de rua contra a ditadura ganharam força às vésperas da realização das eleições diretas para governador, foi a primeira depois do golpe militar de 1964.
No carnaval em Caravelas o povo já manifestava através de uma marchinha carnavalesca composta por um morador da cidade. Uma reportagem de um jornal da época sugere que os foliões usaram a liberdade proporcionada pelo carnaval para ocupar as ruas e endossar as críticas ao general João Figueiredo, então mandatário do país.
Ainda de acordo com o jornal, a composição popular do morador Clodomir Siquara foi entoada como forma de protesto contra o ditador e denunciava a situação do precário abastecimento nacional e a escassez de Petróleo causada pela inoperância do governo diante de uma anunciada crise internacional. Assim cantava, brincava e protestava os foliões que seguiam a batucada no carnaval de 82.
"Ai seu João, Deixa eu Brincar
Com meu carro de mão
Meu carro não tem farol, não tem Buzina
Não gasta Gasolina. Ai seu João
Ele gasta só um pouquinho de feijão
O meu carro é de brinquedo, seu Figueiredo.”
Ainda conforme o jornal a música alcançou “popularidade” durante os quatro dias de Carnaval demonstrando a disposição dos foliões para o protesto que já vinham sendo organizados nas principais capitais do país e que timidamente ganharam fôlego no final de 1982 e definitivamente em 1983 e 1984 pelas "Diretas Já".
EM 1973 UM CARAVELENSE AGITOU “A CAPITAL DO EXTREMO SUL DA BAHIA”
Segundo nota publicada no Jornal O Paiz, de 14 de outubro de 1885, três anos antes da libertação dos negros escravizados no Brasil, o negociante Ângelo Bolo estabelecido na cidade de Caravelas deu carta de liberdade a duas de suas escravas, a “adulta” Emília (16 anos) comprada um ano antes, julho de 1884, e a “infante” Senhorinha (14 anos) que havia comprado com a condição de lhe prestar serviço pelo espaço de sete anos, “conforme a lei lhe dava este direito”. Mas, o que motivou o comerciante a conceder a liberdade às duas mulheres escravas? A seguir algumas cogitações.
Na nota publicada no jornal não há nenhuma pista ou comentário sobre o motivo que levou o negociante a vender às escravizadas além de um expresso “falta de condições”, mas é possível supor que pode ter sido motivada pela aprovação da Lei dos Sexagenários, também conhecida como Lei Saraiva-Cotegipe. Isso porque a lei foi promulgada no dia 28 de setembro de 1885, vinte e quatro dias antes do comunicado escrito pelo comerciante e 47 dias da publicação da nota no jornal.
A Lei que previa liberdade dos sujeitos escravizados que tivessem mais de sessenta anos de idade também estabeleceu normas para libertação gradual dos cativos mediante indenização, assunto que preocupava os senhores de escravos cada dia mais acuados pelo movimento abolicionista que, através da militância de intelectuais negros como Luiz Gama, José do Patrocínio, André e Rebouças, vinham mobilizando a opinião pública, camadas populares, classe média e alguns setores da elite, contra a continuidade dessa forma de exploração dos trabalhadores negros.
No extremo sul da Bahia o movimento também tinha representação e pressionava pelo fim através da militância do Padre Geraldo Sant’ Ana que, segundo o historiador Ricardo Tadeu Caires Silva, era ligado ao partido liberal. Ainda de acordo com o pesquisador o Padre não media esforços para defender a abolição da escravidão e na época se envolveu em diversas polêmicas com escravocratas e autoridades locais denunciando desmandos e excessos.
Outra hipótese que pode ser considerada é a de que provavelmente Emília e Senhorinha eram escravas domésticas ou de ganho, ou seja, sujeitadas a procurar nas ruas uma ocupação paga que lhe obrigava levar para casa, ao fim do dia, uma soma de dinheiro previamente estipulada para o seu senhor.
Nessas modalidades os escravos não só tinham um maior contato com o seu senhor com possibilidades de conversar com os negros forros, aquilombados e abolicionistas, contato que lhes motivavam resistir a exploração forçando a alforria, tal como vinham fazendo os escravos da região de Caravelas e Viçosa, Colônia Leopoldina, através de fugas e revoltas.
Resistência que pode ter motivado o negociante a declarar a manumissão, liberdade legal, de ambas as mulheres que ao serem declaradas livres romperam uma das barreiras e grades que as aprisionavam. A questão segue aberta a historiografia.
Fontes:
MIKI.Yuko. Frontiers of Citizenship: A Black and Indigenous History of Postcolonial Brazil.
SILVA. Ricardo Tadeu. A rebeldia escrava e a derrocada da escravidão na Colônia Leopoldina (1880-1888). 2018
COSTA, Emília Viotti da. A abolição da escravidão.
Foto: Casa colonial Caravelas BA
Daniel Rocha da Silva*
Historiador graduado e pós-graduado em História, Cultura e Sociedade pela UNEB-X.
Contato WhatsApp: ( 73) 99811-8769 e-mail: samuithi@hotmail.com
2 comentários:
Daniel tem como vc me mandar uma cópia digital do livro "o clã muniz de caravelas e alcobaça"
se puder mande no meu email ficarei agradecido.mkaio6712@gmail.com
Daniel tem como vc me mandar uma cópia digital do livro "o clã muniz de caravelas e alcobaça"
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