Caravelas Bahia - História e Memória



CARAVELAS 1885: EPIDEMIA MATOU MILHARES NA CIDADE





Por Daniel Rocha 
Dos males que assustam a humanidade, as grandes epidemias infecciosas são as mais assustadoras. Como em outros lugares do país e do estado a população de algumas cidades do extremo sul da Bahia também encarou epidemias mortais ao longo da história, como a cólera que levou sofrimento e desolação a Caravelas em 1885. 
Segundo Onildo Reis David, entre 1855 -1856 uma devastadora epidemia de cólera-morbus levou pânico e medo na população da cidade de Salvador que desconhecia completamente a doença. Nesse cenário os médicos não estavam bem orientados sobre a prevenção e o tratamento. 
No seu início a doença causou a morte de 08 a 10 pessoas por dia e a população desesperada passou a associar a doença a um castigo divino. “As preces e as procissões de penitência sucediam-se na flagelada cidade do Salvador.” 
O adoecimento de trabalhadores ligados à produção e transporte agravou ainda mais a situação provocando uma crise de abastecimento e a carestia de produtos básicos. A doença se espalhou e chegou a outras cidades portuárias da província, estado, como Caravelas. 
Na portuária Caravelas a doença chegou pouco tempo depois de ter se manifestado em Salvador atingindo uma população já traumatizada pelo surto de disenteria de sangue que atacou a população dois anos antes, 1853. Segundo Ralile, um surto de “Cólera Morbus”  que já tinha dizimado parte da população. 
O drama diante da situação fez com que algumas medidas fossem tomadas para evitar o contágio. Moradores desolados passaram a marcar paredes e portas das residências dos contaminados com uma cruz vermelha e a seguinte frase: “Passa de largo, o cólera-morbus visitou esta família.” 
O governo da província, fez chegar à cidade remédios, auxílio e os médicos José Cândido da Costa e Ernesto Muniz Cordeiro Gitahy, caravelense formado pela Faculdade de Medicina da Bahia que com o amigo José, lutou arduamente contra o cólera.  
Sobre a passagem da doença por outras localidades próximas observou Said (2011) “Não há notícias em Alcobaça de vítimas de epidemia da cólera que abalou Caravelas na década de 1850, mas é bem provável que tenha havido vítimas, sim. De qualquer forma, o medo de epidemia e doenças vindas de vilas vizinhas era constante. A câmara municipal vivia pedindo ao governo provincial o envio de medicamentos para que a população pudesse se precaver de contágios vindo de Prado, por exemplo”. 
A epidemia manteve se ativa até finais de abril de 1856, quando depois de matar cerca de 36,000 começou a declinar.  Segundo Luís Henrique Dias Tavares, sem esgotos, a cidade do Salvador manteve-se aberta às moléstias infectocontagiosas que vez ou outra atacavam sua população, não é difícil supor era também a realidade de Caravelas 

Citações e Referência. 
SAID, Fabio M. O clã Muniz de Caravelas e Alcobaça. São Paulo: edição do autor, 2010. p. 39. 
SAID, Fabio Medeiros. História de Alcobaça Bahia(17721958). São Paulo.p. 92 
David. Onildo Reis. UFBA. O inimigo invisível: epidemia do cólera na Bahia em 1855-56.  1993. p 07,08,09,10. 
Japoneses na conquista do Nordeste: 40 anos da colonização Japonesa no Sul da Bahia.  
Caravelas, BA: Fundação Professor Benedito Ralille, 2006.  

Daniel Rocha da Silva* 
Historiador graduado e Pós-graduando em História, Cultura e Sociedade pela UNEB-X. 
Contato WhatsApp: (73) 99811-8769 e-mail: samuithi@hotmail.com 
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Foto :Fundação Professor Benedito Ralille, 2006 



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Em 1981 crítica à ditadura animou o Carnaval em Caravelas




Por Daniel Rocha

No início da década de 1980, o regime militar mostrava sinais de fraqueza, enquanto partidos e a sociedade civil organizada se mobilizavam nas capitais e no interior para reivindicar a volta da democracia e o fim da supressão dos direitos constitucionais.

Em 1982, os protestos de rua contra a ditadura ganharam impulso às vésperas das eleições diretas para governador, a primeira desde o golpe militar de 1964.

Durante o carnaval de 1981, em Caravelas, a população já se manifestava por meio de uma marchinha carnavalesca composta por um morador da cidade. Uma reportagem da época indicou que os foliões usaram a liberdade proporcionada pelo carnaval para ocupar as ruas e criticar o general João Figueiredo, então presidente do Brasil.

Conforme o jornal, a canção popular de Clodomir Siquara foi entoada como forma de protesto contra o regime, denunciando a precária situação do abastecimento nacional e a escassez de petróleo, resultado da ineficácia do governo frente a uma crise internacional anunciada. Assim, os foliões cantavam, brincavam e protestavam durante o carnaval de 1981:

“Ai seu João, deixa eu brincar
Com meu carro de mão.
Meu carro não tem farol, não tem buzina,
Não gasta gasolina. Ai seu João,
Ele gasta só um pouquinho de feijão.
O meu carro é de brinquedo, seu Figueiredo.”

Ainda segundo o jornal, a música alcançou grande popularidade durante os quatro dias de carnaval, evidenciando a disposição dos foliões para o protesto, que já vinha sendo organizado nas principais capitais do país. Esse movimento, que ganhou força no final de 1982, se consolidou definitivamente em 1983 e 1984 com as campanhas pelas “Diretas Já”.

Daniel Rocha da Silva*

Historiador graduado  e Pós-graduado em História, Cultura e Sociedade pela UNEB-X.

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EM 1973 UM CARAVELENSE AGITOU “A CAPITAL DO EXTREMO SUL DA BAHIA”





Em 1973, a história de Odorico Lopes, tabelião da cidade baiana de Caravelas, ganhou destaque nacional. Com 67 anos, ele fez uma aposta de 8,00 cruzeiros — o que hoje equivaleria a cerca de 10 reais — na cidade mineira de Nanuque. O que ninguém esperava era que ele se tornaria o único ganhador de um prêmio estrondoso de 13 milhões na antiga "Loteria Esportiva Federal". 

Naquele período, esse valor era considerado o maior prêmio já concedido no mundo. A notícia rapidamente se espalhou, sendo amplamente divulgada por jornais da Bahia, Minas Gerais e de circulação nacional, revelando uma profunda conexão histórica entre os dois estados, especialmente na região do extremo sul da Bahia.

O cartão que o consagrou como vencedor foi perfurado na cidade de Nanuque, em Minas Gerais, local frequentemente visitado por Lopes em suas idas à sua fazenda de gado. Essa ligação com Nanuque fomentou a crença de que o ganhador poderia ser um residente local, gerando uma agitação notável entre os mineiros da divisa. 

A expectativa popular desencadeou um movimento na porta da prefeitura mineira, onde a presença de segurança se fez necessária para conter a multidão ávida por notícias sobre o ganhador. A tensão entre os curiosos foi finalmente dissolvida com a revelação de que o prêmio pertencia a um morador de Caravelas, na Bahia.

Esse episódio destaca um fato bem conhecido entre os historiadores da região baiana: até a década de 1970, Nanuque era vista como a "capital" do extremo sul da Bahia, servindo como um centro vital para o comércio e abastecimento do vale do Mucuri e das cidades circunvizinhas como Caravelas, Alcobaça, Mucuri, Nova Viçosa e Teixeira de Freitas, quando ainda era um povoado.

Influência  construída durante décadas pela Estrada de Ferro Bahia-Minas (EFBM), inaugurada em 1882,  que durante décadas foi um elemento determinante nesse intercâmbio na divisa, conectando o nordeste de Minas Gerais ao sul da Bahia por meio  da circulação de pessoas, bens e culturas.

Influência que começou a se enfraquecer a partir da desativação da via férrea em 1966, em decorrência da abertura de novas rodovias, como a BR-101, reconfigurou as dinâmicas regionais, subjugando a área a influências mais marcadas pelos estados do sudeste e pela capital baiana, Salvador.

Nesse contexto, o relato do apostador baiano que ascendeu à riqueza na divisa com Minas Gerais ilustra também que a Estrada de Ferro Bahia-Minas foi mais do que um simples canal de trocas comerciais; ela funcionou como um espaço de intercâmbio cultural e de costumes que nas décadas seguintes a sua desativação, 1970 e 1980, se mantiveram muito firmes, transcendendo as divisões 


Fontes:
ELEUTÉRIO,  Arysbure Batista. Estrada de Ferro Bahia e Minas “A Ferrovia do Adeus”.
NETO, Sebastião Pinheiro Gonçalves de Cerqueira. Contribuição ao estudo Geográfico do município de Nanuque. 2001.
Jornal O Globo, março de 1973
Correio Manhã Abril de 1974
Foto principal: Cidade de Nanuque

Caravelas 1885: A alforria de duas mulheres escravas

Por Daniel Rocha
 

Segundo nota publicada no Jornal O Paiz, de 14 de outubro de 1885, três anos antes da libertação dos negros escravizados no Brasil, o negociante Ângelo Bolo estabelecido na cidade de Caravelas deu carta de liberdade a duas de suas escravas, a “adulta” Emília (16 anos) comprada um ano antes, julho de 1884, e a “infante” Senhorinha (14 anos) que havia comprado com a condição de lhe prestar serviço pelo espaço de sete anos, “conforme a lei lhe dava este direito”. Mas, o que motivou o comerciante a conceder a liberdade às duas mulheres escravas? A seguir algumas cogitações.

Na nota publicada no jornal não há nenhuma pista ou comentário sobre o motivo que levou o negociante a vender às escravizadas além de um expresso “falta de condições”, mas é possível supor que pode ter sido motivada pela aprovação da Lei dos Sexagenários, também conhecida como Lei Saraiva-Cotegipe. Isso porque a lei foi promulgada no dia 28 de setembro de 1885, vinte e quatro dias antes do comunicado escrito pelo comerciante e 47 dias da publicação da nota no jornal. 

A Lei que previa liberdade dos sujeitos escravizados que tivessem mais de sessenta anos de idade também estabeleceu normas para libertação gradual dos cativos mediante indenização, assunto que preocupava os senhores de escravos cada dia mais acuados pelo movimento abolicionista que, através da militância de intelectuais negros como Luiz Gama, José do Patrocínio, André e Rebouças, vinham mobilizando a opinião pública, camadas populares, classe média e alguns setores da elite, contra a continuidade dessa forma de exploração dos trabalhadores negros.

No extremo sul da Bahia o movimento também tinha representação e pressionava pelo fim através da militância do Padre Geraldo Sant’ Ana que, segundo o historiador Ricardo Tadeu Caires Silva, era ligado ao partido liberal. Ainda de acordo com o pesquisador o Padre não media esforços para defender a abolição da escravidão e na época se envolveu em diversas polêmicas com escravocratas e autoridades locais denunciando desmandos e excessos. 

Outra hipótese que pode ser considerada é a de que provavelmente Emília e Senhorinha eram escravas domésticas ou de ganho, ou seja, sujeitadas a procurar nas ruas uma ocupação paga que lhe obrigava levar para casa, ao fim do dia, uma soma de dinheiro previamente estipulada para o seu senhor.

Nessas modalidades os escravos não só tinham um maior contato com o seu senhor com possibilidades de conversar com os negros forros, aquilombados e abolicionistas, contato que lhes motivavam resistir a exploração forçando a alforria, tal como vinham fazendo os escravos da região de Caravelas e Viçosa, Colônia Leopoldina, através de fugas e revoltas.

Resistência que pode ter motivado o negociante a declarar a manumissão, liberdade legal, de ambas as mulheres que ao serem declaradas livres romperam uma das barreiras e grades que as aprisionavam. A questão segue aberta a historiografia.

Fontes: 

MIKI.Yuko. Frontiers of Citizenship: A Black and Indigenous History of Postcolonial Brazil.  

SILVA. Ricardo Tadeu. A rebeldia escrava e a derrocada da escravidão na Colônia Leopoldina (1880-1888). 2018 

COSTA, Emília Viotti da. A abolição da escravidão. 

Foto: Casa colonial Caravelas BA

Daniel Rocha da Silva*

Historiador graduado  e pós-graduado em História, Cultura e Sociedade pela UNEB-X.

Contato WhatsApp: ( 73) 99811-8769 e-mail: samuithi@hotmail.com

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Comentários

Unknown disse…
Daniel tem como vc me mandar uma cópia digital do livro "o clã muniz de caravelas e alcobaça"
se puder mande no meu email ficarei agradecido.mkaio6712@gmail.com
Unknown disse…
Daniel tem como vc me mandar uma cópia digital do livro "o clã muniz de caravelas e alcobaça"
se puder mande no meu email ficarei agradecido. mkaio6712@gmail.com

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