O mamão na história de Teixeira: Todo o mundo gostava… Exceto o teixeirense

 




Por Daniel Rocha

Diante da ocupação japonesa no campo e da atividade agrícola local, através de seus descendentes, e da Cooperativa Agrícola de Cotia, o mamão não caiu no gosto dos teixeirenses e também não foi aceito como parte do universo cultural e cotidiano local, segundo alguns jornalistas que visitaram a cidade para noticiar a região quando a mesma ocupava o posto de maior produtor da fruta do mundo”. 

A primeira observação direta sobre o assunto foi registrada através do jornalista Demóstenes Teixeira, enviado especial à cidade pelo Jornal O Estado de São Paulo, em 1985, pelo então coordenador da Cotia em Teixeira de Freitas, BA, Paulo Tateishi.    

Ao comentar que praticamente todo mamão produzido era exportado para os mercados do Sudeste, afirmou o diretor da cooperativa que: “infelizmente os nordestinos ainda não adquiriram o hábito de consumir frutos e, por isso, o mercado na região é ainda incipiente”.    

A questão também foi captada, de forma indireta, também pela Revista Veja, em 1988, em uma reportagem intitulada: “Reino do sol nascente”, sobre como os japoneses da Cooperativa de Cotia mudaram o panorama do campo e o perfil das cidades do interior em diversas regiões do Brasil. Sobre Teixeira de Freitas, destacou que um restaurante de comida japonesa na cidade vinha fazendo sucesso com a popularização de pratos típicos japoneses.   

Contudo, em uma cidade onde a produção do mamão era a grande referência, o fruto não foi citado como um produto que vinha caindo nas graças dos consumidores locais. Curiosamente, ao tentar convencer que a população teixeirense se rendia aos sabores orientais, revelou o contrário do que supostamente vinha acontecendo, uma iguaria da região é que tinha conquistado os japoneses e descendentes. 

 “O Karaokê Shinosaki, em Teixeira de Freitas, é a sensação da cidade – para gente de olhos puxados ou não (…) popularizou na cidade pratos antes restritos somente à colônia japonesa, como a Tempura, a Lula na Chapa e o Sukiyaki. Como não é milagroso, seu restaurante colocou no cardápio o guaiamum, um caranguejo grande, muito comum na região, o novo vício dos orientais.”   

 Contudo, foi o jornalista Geraldo Hasse, da Revista Globo Rural, em 1994, que melhor observou a resistência dos teixeirenses à introdução do mamão em seus costumes e hábitos. Em uma reportagem intitulada “Com sabor da Bahia”, sobre a produção na região do extremo sul baiano, escreveu:   

“Embora tenha tanto peso na renda regional, a lavoura do mamão não tem destaque nas quitandas locais. Só é servido no café da manhã nos hotéis. Ninguém faz suco ou doces. E os vendedores de picolés não incluem o mamão no seu pregão de ofertas. Na verdade, a fruta ainda não caiu no gosto dos habitantes de Eunápolis, Teixeira de Freitas e outras cidades. Afinal ainda não faz parte de seu universo cultural, muito mais ligado à pecuária. Para a maioria da população o mamão é apenas uma moda de exportação. E passageira.” 

Ainda no que diz respeito à questão, em uma breve consulta informal aos antigos moradores da cidade, dentre esses trabalhadores do mamão, foi identificado uma explicação popular para a não aceitação em massa do fruto no seu período de maior destaque na região.  

De acordo com esses moradores e trabalhadores, a não aceitação do mamão acontecia no período porque existia um conhecimento público de que às melhores frutas colhidas nas lavouras eram selecionadas para exportação e os piores frutos, “os machucados, os manchados, os pequenos,” destinados aos consumidores locais. “Alguns não gostavam.”De acordo com a reportagem de Hasse, na Globo Rural, de fato havia seleção dos melhores para exportação do fruto para o sudeste e Europa pedia cuidados.   

Tais razões apontadas pelas hipóteses vão de encontro à visão do historiador britânico Edward Palmer Thompson (1924 -1993), de que a cultura tradicional é rebelde, uma consciência dupla que resiste em nome dos costumes às inovações econômicas e sociais do capitalismo.  

O autor retrata em sua obra, Costumes em comum, que um Estado hegemônico enfrenta vulnerabilidades, como por exemplo, a capacidade dos homens e mulheres de agir, negociar e fazer escolhas livres de forma autônoma e independente das imposições oficiais e dos dominantes, tal como, supostamente, aconteceu em Teixeira de Freitas das décadas de 1980 e 1990.” 

Fontes:

Thompson,Edward Palmer. Costumes em Comum – Estudos Sobre a Cultura Popular Tradicional.

O Estado de São Paulo, 1985.

Revista Veja, 1988.

Revista Globo Rural, 1994.

Foto: pessoas selecionando mamão. Teixeira de Freitas: 1988

Daniel Rocha da Silva*

Historiador graduado  e Pós-graduado em História, Cultura e Sociedade pela UNEB-X. Contato WhatsApp: ( 73) 99811-8769 e-mail: samuithi@hotmail.com

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