A represa do bairro Recanto do Lago em Teixeira de Freitas





Onde estava localizado o lago que inspirou o nome do bairro Recanto do Lago? Segundo relatos, não havia um lago, mas sim uma represa conhecida como “Represa do Córrego Charqueada”, que era popularmente chamada de “Represa do Jacarandá”. 

Essa barragem, situada no vale atrás do Clube no Bairro Recanto do Lago, foi construída no início da década de 1970 e destruída no início da década de 1990, provavelmente em 1991.

Durante sua existência, a represa se tornou um local marcado por inúmeros afogamentos, desova de corpos, tragédias e intensas interações sociais, de acordo com os moradores da região. 

Walfrido de Freitas Corrêa, antigo proprietário das terras onde a barragem foi erguida, relatou que a construção da represa ocorreu na década de 1970, após a venda de parte de sua propriedade, localizada próxima à área que, anos depois, abrigou o Clube Jacarandá. Por essa razão, o nome da barragem foi associado a esse espaço de lazer.

Um estudo da CEPLAC (Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira), de 1974, indicou que, no ano da suposta construção da barragem, o Córrego Charqueada foi considerado uma alternativa viável para a criação de um reservatório de água para abastecer o então povoado de Teixeira de Freitas. Embora o estudo não mencione a represa, é razoável supor que sua construção tenha ocorrido no contexto dessa pesquisa.

Considerando essa hipótese, a represa, que tinha acesso livre, serviu por aproximadamente 21 anos à população local como um espaço para atividades domésticas e de lazer. Trabalhadores, moradores e pessoas de outros bairros frequentavam o local para banhos, pesca e mergulho.

Com o tempo, um número elevado de afogamentos tornou o lugar temido por pais e moradores, especialmente porque estudantes de escolas próximas o frequentavam durante a semana para se divertir, mesmo faltando às aulas.

Durante esse período, a profundidade e a correnteza da represa se tornaram perigosas para trabalhadores e pessoas de baixa renda, segundo Gilberto Bandeirante, um antigo morador da cidade, que também mencionou que o local era frequentado por indivíduos de má índole. 

Ele revelou que, nos anos em que residiu na cidade, a represa era um ponto conhecido para a “desova de corpos de vítimas de criminosos e pistoleiros que atuavam na região”.

Evitando entrar em detalhes, ele contou que o afogamento de um jovem muito conhecido e os constantes rumores sobre atividades criminosas motivaram a demolição da barragem em 1991. Depois que a represa foi esvaziada, várias ossadas humanas foram encontradas em seu fundo.

Essa perspectiva contrasta com o relato de Sebastião Justiniano, que citou o afogamento do jovem “Cavaco”, um trabalhador braçal muito popular, como um dos motivos para o rompimento da represa. 

Sebastião afirmou que, temendo outras tragédias semelhantes, um grupo de frequentadores decidiu perfurar a represa, criando uma pequena abertura na lateral usando força braçal e picaretas.

Quanto às ossadas encontradas após o esvaziamento, Sebastião discordou, alegando que apenas avistou um fio de energia amarrado a uma pedra, que parecia ligado a algo soterrado pela lama. Ele afirmou que percorreu toda a extensão do vale após o esvaziamento e não encontrou nada além de restos de animais e madeira.

Se realmente ocorreu, como muitos moradores mencionam em conversas informais, o esvaziamento da represa estava relacionado ao desaparecimento do radialista Ivan Rocha, em 1991, que desencadeou uma intensa busca pelo seu corpo, que nunca foi encontrado. 

Ivan Rocha, de 34 anos, havia denunciado na Rádio Alvorada ter um dossiê sobre as atividades de um “sindicato do crime na região” e desapareceu logo depois. Seu desaparecimento foi associado à menção de políticos conhecidos da cidade e de autoridades do Estado, levando à suposição de que isso poderia ter motivado o fim da represa e influenciado as especulações sobre os eventos.

Walfrido Corrêa, o antigo proprietário da área onde a represa foi construída, contou, em tom de “causo”, que o rompimento causou a morte de uma moradora. Segundo sua narrativa ao colaborador Domingo Cajueiro Correia, uma jovem que lavava roupas nas margens do Córrego Charqueada, perto do bairro São José, foi levada pela força da água após o rompimento. 

Para encontrar o corpo, a família recorreu a uma simpatia antiga, colocando uma cuia com uma vela acesa no córrego, que, seguindo o curso, localizaria o corpo onde estava boiando. E assim ocorreu.

Embora os relatos e perspectivas que fundamentam este texto sobre a represa careçam de mais detalhes, as informações preliminares permitem concluir que, enquanto esteve em atividade, a represa estabeleceu uma relação de proximidade com a realidade social, política e cultural de parte da população durante o período em questão, ao ponto de nomear o bairro que surgiu nas proximidades durante sua construção e popularização.

Fontes

ROCHA FILHO, Carlos Armando. Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira. Recursos Hídricos. Rio de Janeiro: CEPLAC, 1976.

Relatório final da CPI da "Pistolagem". Câmara dos Deputados. Centro de Documentação e Informação, Coordenação de Publicações, 1994.

BARREIRA, César. Crimes por encomenda: violência e pistolagem no cenário brasileiro. Relume Dumará, 1998.

Fontes orais:

Relatos de Walfrido Corrêa, captados pelo memorialista e colaborador do site Domingos Cajueiro Correia, setembro de 2019.

Conversas informais com Gilberto Bandeirante, julho de 2019, e Sebastião Justiniano, junho de 2019.

Foto: Acervo.


Daniel Rocha da Silva*

Historiador graduado  e Pós-graduado em História, Cultura e Sociedade pela UNEB-X.

Contato WhatsApp: ( 73) 99811-8769 e-mail: samuithi@hotmail.com

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