Teixeira de Freitas Secreta : A igreja subterrânea




Por Daniel Rocha
Quem poderia imaginar que, no coração de Teixeira de Freitas, Bahia, próximo à movimentada Avenida Presidente Getúlio Vargas, existe uma antiga igreja subterrânea, que por muitos anos esteve próxima da primeira cruz erguida oficialmente pela Igreja Católica na cidade?

Construída em 1973, essa igreja, conhecida carinhosamente pelos católicos como "Igrejinha Subterrânea", está localizada na Rua do Rotary Club, ao lado do antigo fórum e da Casa Paroquial, em frente ao antigo Hospital Santa Rita, atualmente Unidade Municipal Materno Infantil (UMMI).

Situada em uma das áreas mais movimentadas, a igrejinha, que passa despercebida pela maioria dos transeuntes, possui uma estrutura simples. O acesso se dá por uma porta frontal que leva a uma escadaria de 17 degraus, conduzindo a um pequeno salão de aproximadamente 225 metros quadrados, onde se encontra um altar antigo, construído no estilo dos anos 1970, atualmente sem adornos religiosos.

No local não há qualquer luxo arquitetônico, exceto por um pequeno vitral circular no teto, que revela sutilmente uma influência europeia e lembra que o visitante está a alguns metros abaixo do nível do solo. Uma discreta placa de mármore na entrada de uma das salas indica que ali nasceu o movimento carismático, uma expressão de fé conservadora, na cidade. O piso, visivelmente desgastado, sugere que nunca foi  substituído desde sua construção.

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Segundo o holandês Frei Elias (em memória), em um vídeo publicado no site da diocese, aquele espaço era parte de um projeto original de uma igreja franciscana, que não foi totalmente concluído em 1973. Acredito que o rápido crescimento populacional da época levou a igreja a planejar algo maior para um povoado que se transformava em cidade, apesar de enfrentar sérios problemas sociais.

Nos anos 1970, em meio à alta exclusão social dos dois últimos presidentes militares, os franciscanos e a igreja atuavam fortemente para oferecer assistência aos mais pobres, estabelecendo escolas e centros comunitários em muitas das novas igrejas católicas, o que exigia espaços maiores.

O que restou do antigo projeto foi transformado na Igreja Subterrânea de São Francisco, que contava com uma cruz de jacarandá nas proximidades, a mesma que foi colocada na primeira capela erguida no centro da cidade, na Praça dos Leões, em homenagem a Santo Antônio.

A cruz, posicionada na esquina do terreno voltada para a Avenida Getúlio Vargas, trazia gravado em seu muro de sustentação a frase: "Sob este signo vencerás. Essa cruz marca a história de Teixeira de Freitas, tendo sido colocada em frente à capela antiga em 1954, na Igreja São Pedro em 1979, e fixada neste templo cristão em 1984”.

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De 1981 a 1983, a "Igrejinha Subterrânea" serviu como local de missas e foi o ponto de encontro da primeira formação do movimento da Renovação Carismática Católica (RCC) do extremo sul da Bahia. O grupo, denominado Emanuel, cresceu rapidamente, exigindo mais espaço e, por isso, os organizadores decidiram transferir os encontros para a Igreja São Pedro em 1984.

Estima-se que a "Igrejinha Subterrânea" permaneceu ativa até 1988 ou 1989, funcionando ocasionalmente até meados dos anos 1990. Nos anos 2000, ficou praticamente abandonada e, em algumas ocasiões, restrita até 2011, quando foi restaurada e reaberta em 2014 para receber a imagem peregrina de Nossa Senhora Aparecida.

Atualmente, no local funciona o grupo “23 de maio” dos Alcoólicos Anônimos (AA), cujas reuniões abertas ao público ocorrem às quartas-feiras e aos sábados, das 19 às 21 horas. O grupo, que há mais de 20 anos vem resgatando milhares de pessoas do vício, é responsável pelo espaço.

A igrejinha é um símbolo de memória, refletindo a presença franciscana na região, especialmente das freiras e padres holandeses que dedicaram suas vidas à evangelização e educação da sociedade.

É importante ressaltar que, em uma cidade como Teixeira de Freitas, onde construções do passado são frequentemente modificadas ou destruídas, é valioso preservar a igrejinha, que, embora silenciosa, estabelece conexões com a história e a memória religiosa local.

Para evitar que o mesmo ocorra com a pioneira Cruz de Jacarandá, que terminou esquecida e deteriorada pelo tempo em uma das avenidas mais movimentadas do extremo sul baiano, devemos lembrar e valorizar esse espaço significativo.

Fontes e Referências

HOOIJ, Frei Elias. Os Desbravadores do Extremo Sul da Bahia: História da Presença Franciscana nesta Região – Raízes e Frutos. Belo Horizonte, 2011.

Entrevista com Frei Elias Hooij, Marcos Monteiro e Lourenço Tollenaar. Revista dos Franciscanos. Província Santa Cruz, Edição nº 02, Abril/Julho de 2011.

SCHERER, Karine Pagliosa. A Renovação Carismática Católica na Condição Pós-Moderna e na Hipermodernidade: As Características dos Seus Sujeitos Ante as Novas Tendências dos Tempos Atuais. Consultado em 02/02/2018. Disponível em: https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/1912/1/Karine%20Pagliosa%20Scherer.pdf.

Igreja Subterrânea Recebe a Imagem Peregrina de Nossa Senhora Aparecida. Consultado em 12/12/2015. Disponível em: http://saofranciscotx.com/home/igreja-subterranea-recebe-a-imagem-peregrina-de-nossa-senhora-aparecida.

Segundo Dia do Tríduo de 24 Anos da Paróquia São Francisco. Consultado em 2016. Disponível em: http://saofranciscotx.com/home/segundo-dia-do-triduo-de-24-anos-da-paroquia.

RCC História. Consultado em 03/08/2017. Disponível em: http://rccteixeira.com.br/historia.

Entrevista com Frei Elias Hooij. Entrevista concedida à Câmara Municipal de Teixeira de Freitas-BA em 26 de Janeiro de 2016. Acessado em 2017. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=gPChWhyu8Fo&t=76s.

Colaboradores:

  • Roselane Neves, relatos orais.
  • Marielson Ribas, transporte e cálculos.
  • Julian Rigo, coordenadora da Pastoral da Comunicação Diocesana, via e-mail.

Imagens:

  • Foto da Igreja: Google.
  • Foto da Cruz de Jacarandá: Extraída da revista As Origens, Teixeira de Freitas, Fortaleza – Ceará, p. 05-07, Janeiro 1986.
  • Grupo de RCC, década de 1980: Extraída do site rccteixeira.com.br.

Se você chegou até aqui, parabéns! Você tem o hábito da leitura.

Atualizado em Setembro 2024

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